Sunday, May 22, 2005

Literatura???

Tem coisa que nao e questao de gosto:


"Participei irresponsavelmente de certas seitas, pratiquei rituais que me levaram a pagar um preço alto. Tudo isso em nome de uma busca absolutamente natural no homem: a resposta para o mistério da vida. Mas encontrei também muita gente que realmente era capaz de lidar com forças que iam além da minha compreensão. Vi o tempo ser alterado, por exemplo."

Paulo Coelho na Revista do Globo de 21 de Maio

Saturday, May 21, 2005

Dogville

A revista americana Newsweek de maio estampa a foto do presidente francês Jaques Chirac ao lado dos dizeres: “Europe’s Dinosaur”. Ainda na capa a publicação pergunta “Is Jaques Chirac dragging his country down?”. Como se não bastasse a imparcialidade da imprensa americana, o que assusta e o moralismo de quem olha sem respeito para alteridade e dissimula a perfeição de uma democracia combalida e entregue a fanatismos religiosos e morais.
A reportagem assinada por Christoplher Dickey e Eric Pane acusa Chirac de conduzir o povo francês a ruína munido apenas de um discurso exaltado sobre o glorioso passado da nação. Como prova do argumento, a revista expõe declarações de opositores franceses e europeus que vêem na figura do presidente o símbolo do atraso e do nacionalismo francês diante dos obstáculos do funcionamento da União Européia.
Segundo os autores, a Franca estaria cada vez mais decadente – medíocre foi a palavra usada -, e os próprios franceses já não estariam mais satisfeitos com Chirac. O governo francês estaria num impasse diante do crescimento dos muçulmanos dentro do pais e desconfiados da Constituição Européia.
Ate certo ponto, alguns argumentos fazem sentido, a intenção dos repórteres e que denuncia a farsa. Segundo as brilhantes mentes norte-americanas, a posição francesa com relação ao Gênio Indomável (Bush) e a invasão do Iraque foram apenas saídas para desviar o olhar do eleitorado diante dos fracassos políticos de Chircac. Logo os americanos dizendo isso?? Logo eles que inventaram tal modalidade – que o diga Tio Bill Pinton. Isso parece o caso do namorado ciumento, daqueles que tem medo de que a namorada faca o mesmo que ele faz ou pensa em fazer.
O ressentimento americano diante da insistente recusa francesa a qualquer apoio a cruzada do Iraque e compreensível. O que não e compreensivo e o renovado esforço americano, e isso não exclui sociedade civil, em tentar reescrever a historia e atribuir novas causas e efeitos a atores que não lhe dizem respeito. A duas semanas atrás o Gênio Indomável esteve na Geórgia fazendo exatamente isso. E não e so isso, os americanos também tem estado inclinados a se meter em assuntos que não lhe dizem respeito. Quem não se lembra das declarações do nosso herói na Turquia em meados do ano passado, quando disse que “apoiava” a entrada do pais para a União Européia.
Imprensa e Governo, unidos pelo mesmo esforço. E natural que o governo francês venha a ser alvo de critica ou de demasiada atenção pelos dos amigos do norte. Não e de hoje que a Franca impera como um dos maiores obstáculos dos EUA.
Quando De Gaulle assumiu as rédeas da gênese da Comunidade Europeia, e mesmo ultra-nacionalista que era, viu na instituição um instrumento eficaz – provavelmente o único – como resistência aos EUA. De certa forma a identidade francesa perante os estados europeus no século XX parece ter se fundado justamente do desconforto diante do giagantismo norte-americano e da impossibilidade material de se reviver sozinha a grande nação francesa do século XIX. E inegável a pretencao de Chirac de se tornar uma liderança efetiva no cenário europeu, entretanto, isso so faz dele, no mínimo, coerente com o comportamento da liderança francesa desde os tempos de De Gaulle.
Portanto, quando Chirac se recusa a entrar numa guerra sem razoes aparentes, ou mesmo quando recusa apoio explicito as causas mais elementares americanas, ele nada mais e do que uma coerência histórica. A crise exposta pela Newsweek perde a razão quando seus argumentos são frágeis diante da imponência da figura de um presidente a dez anos no cargo. Como os franceses podem estar tão insatisfeito com uma figura tão emblemática que perdura por uma década?
A única coerência da reportagem e do comportamento típico de quem procura rugir contra o vizinho e calar-se diante das próprias desgraças. Não passa de um cenário similar a Dogville, um moralismo fanático onde impera a ordem de uma moral decadente incapaz de uma auto-critica.
Chirac e sim um dinossauro europeu. Mas não no sentido que nossos amáveis repórteres pretenderam aplicar, como velho, antigo e superado. Chirac e a rara imagem eternizada com a causa francesa do século XX, e se não e uma unanimidade mesmo na Franca, não e alvo de desprezo e desprestigio como as lideranças americanas tem sido por longos anos.